PROSAS EM VERSOS

SER POETA, É SENTIR AFLORAR DA PELE SENSIBILIDADE, É OUVIR O GRITO DOS QUE NADA DISSERAM, É VER POR UMA GAMA DE CORES INVISÍVEIS À MACROSCÓPICA VISÃO DOS INSENSÍVEIS, É PENETRAR IMPIEDOSAMENTE À ALMA HUMANA.

sábado, 14 de janeiro de 2012

Desde a Aurora





Fernando Martinho






Como um sol de polpa escura
para levar à boca,
eis as mãos:
procuram-te desde o chão,

entre os veios do sono
e da memória procuram-te:
à vertigem do ar
abrem as portas:

vai entrar o vento ou o violento
aroma de uma candeia,
e subitamente a ferida
recomeça a sangrar:

é tempo de colher: a noite
iluminou-se bago a bago: vais surgir
para beber de um trago
como um grito contra o muro.

Sou eu, desde a aurora,
eu — a terra — que te procuro.

Eugénio de Andrade, in "Obscuro Domínio"

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Você faz parte daqui