Maria Salete Ariozi
Amo-vos, idealismo e realismo,
Como água e pedra
Sois
Partes do mundo,
...Luz e raiz da árvore da vida.
Não me fechem os olhos
Mesmo depois de morto,
Ainda precisarei deles para aprender,
Para olhar e compreender a minha morte.
Necessito da boca
Para cantar depois, quando não existir.
E de minha alma, meu corpo, minhas mãos
Para continuar a amar-te, minha amada.
Sei que não pode ser, mas desejei-o.
Amo o que não tem mais do que sonhos.
Tenho um jardim de flores que não existem.
Sou decididamente triangular.
Dou pela falta das minhas orelhas,
Mas enrolei-as para as abandonar
Num porto fluvial no interior
Da República da Malagueta.
Não posso mais com a razão no ombro.
Quero inventar o mar de cada dia.
Veio ver-me uma vez
Um grande pintor que vintava soldados.
Todos eram heróicos e o bom homem
Pintava-os no campo de batalha
Morrendo com prazer.
Também pintava vacas realistas
E eram tão extremamente vacas
Que nos íamos tornando melancólicos
E dispostos a ruminar eternamente.
Execração e horror! Li romances
Interminavelmente bondosos
E tantos versos sobre
O Primeiro de Maio
Que agora escrevo apenas sobre o 2 desse mês.
Parece que o homem
Atropela a paisagem
E a estrada que antes tinha céu
Abate-nos agora
Com a sua pertinácia comercial.
Assim acontece com a beleza
Como se não quiséssemos comprá-la
E empacotam-na a seu gosto e maneira.
Há que deixar que a beleza dance
Com os galãs menos recomendáveis,
Entre o dia e a noite:
Não a obriguemos a tomar a pílula
Da verdade como um medicamento.
E o real? Também, sem dúvida alguma,
Mas que nos aumente,
Que nos alongue, que nos arrepie,
Que nos exprima
Tanto a ordem do pão como a da alma.
A sussurrar! Ordeno
Ao bosque puro
Que diga em segredo o seu segredo,
E à verdade: Não te detenhas tanto
Que te endureças até à mentira.
Não sou reitor de nada, não comando
E por isso entesouro
Os equívocos todos no meu canto.
PABLO NERUDA
Amo-vos, idealismo e realismo,
Como água e pedra
Sois
Partes do mundo,
...Luz e raiz da árvore da vida.
Não me fechem os olhos
Mesmo depois de morto,
Ainda precisarei deles para aprender,
Para olhar e compreender a minha morte.
Necessito da boca
Para cantar depois, quando não existir.
E de minha alma, meu corpo, minhas mãos
Para continuar a amar-te, minha amada.
Sei que não pode ser, mas desejei-o.
Amo o que não tem mais do que sonhos.
Tenho um jardim de flores que não existem.
Sou decididamente triangular.
Dou pela falta das minhas orelhas,
Mas enrolei-as para as abandonar
Num porto fluvial no interior
Da República da Malagueta.
Não posso mais com a razão no ombro.
Quero inventar o mar de cada dia.
Veio ver-me uma vez
Um grande pintor que vintava soldados.
Todos eram heróicos e o bom homem
Pintava-os no campo de batalha
Morrendo com prazer.
Também pintava vacas realistas
E eram tão extremamente vacas
Que nos íamos tornando melancólicos
E dispostos a ruminar eternamente.
Execração e horror! Li romances
Interminavelmente bondosos
E tantos versos sobre
O Primeiro de Maio
Que agora escrevo apenas sobre o 2 desse mês.
Parece que o homem
Atropela a paisagem
E a estrada que antes tinha céu
Abate-nos agora
Com a sua pertinácia comercial.
Assim acontece com a beleza
Como se não quiséssemos comprá-la
E empacotam-na a seu gosto e maneira.
Há que deixar que a beleza dance
Com os galãs menos recomendáveis,
Entre o dia e a noite:
Não a obriguemos a tomar a pílula
Da verdade como um medicamento.
E o real? Também, sem dúvida alguma,
Mas que nos aumente,
Que nos alongue, que nos arrepie,
Que nos exprima
Tanto a ordem do pão como a da alma.
A sussurrar! Ordeno
Ao bosque puro
Que diga em segredo o seu segredo,
E à verdade: Não te detenhas tanto
Que te endureças até à mentira.
Não sou reitor de nada, não comando
E por isso entesouro
Os equívocos todos no meu canto.
PABLO NERUDA
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